segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

A verdadeira história da avaliação dos professores...

A história que vos conto na primeira pessoa passou-se numa escola qualquer.

No inicio de mais uma aula houve um grupo de 3 ou 4 alunos que se dirigiram a mim.

Perguntaram-me porque é que andava tão triste e aborrecido. Não lhes pude mentir.

Respondi que era por causa da avaliação dos professores, mas que não tinham com que se preocupar, que isso era problema de adultos.

Eles retorquiram que eles também eram avaliados e que não viam qual era o problema em o professor ser avaliado. Percebi que podia ali, naquele momento, fazer com eles uma pequena brincadeira de criança.

Mandei sentar e pedi silêncio à turma toda, para fazermos um pequeno jogo que não levaria mais de cinco minutos da minha aula.

Disse à turma que na próxima avaliação da Páscoa em vez de os avaliar pelo trabalho e aprendizagens desenvolvidas resolvi mudar para um novo modelo de avaliação.

Eles perguntaram logo: então como vai ser?

Peguei num pau de giz e escrevi no quadro:

Cinco-

Quatro-

Quatro-

Quatro-

Quatro-

Quatro-

Para que é isso? Perguntaram eles. Então só há um cinco? E esses quatros são para quem?

Prestem atenção, disse eu. Abri o livro de ponto na página das fotos dos 20 alunos da turma e fechando os olhos apontei com o dedo ao acaso. Abri os olhos e disse: João.

Diga, disse ele surpreendido.

Vem ao quadro e coloca o nome dos teus colegas que merecem estas notas na Páscoa.

Não, não vou, disse ele, o professor é que sabe, para isso estudou e tem experiência.

Tens que vir senão marco-te falta, obviamente a brincar.

Mas tem mesmo que ser? Voltou ele.

Sim.

Levantou-se e aos poucos preencheu a lista com os nomes daqueles que ele entendeu.

Perguntei eu de seguida à turma: estarão bem atribuídas as notas?

A turma disse em coro um afinado Não.

Perguntei de novo à turma: quem depois das escolhas do João continuava a ser amigo dele como era antes? Ninguém se manifestou, um silêncio de morte invadiu a sala.

Para terminar perguntei ao João: como te sentias contigo e com os teus colegas se este jogo fosse verdade? E eles contigo?

Respondeu: tristes e aborrecidos.

Estava dada a primeira lição de vida da aula.

Espero que o João ou outro aluno nunca venham a experimentar este jogo na realidade. Para bem do bom relacionamento interpessoal nas suas futuras profissões, numa sociedade em que as relações humanas são desvalorizadas em detrimento das tecnologias obsoletas que nos metem à frente.

Para os adultos deixo as 3 principais razões pelas quais me sinto triste e aborrecido com este modelo de avaliação:


1º (e desculpem os meus futuros avaliadores) Porque não reconheço legitimidade nem competência em nenhum colega meu para qualificar ou quantificar o meu desempenho enquanto professor;


2º (e para desagrado de alguns) Porque não me sinto nem superior, nem inferior em nada comparativamente aos meus colegas de profissão, independentemente da sua experiência ou situação profissional.


3º (em sinal de desagrado com o acomodar de outros) Porque no lugar de avaliador, seria incapaz de distinguir os meus semelhantes sabendo que avaliaria uns em prejuízo de outros, pois quer queiram quer não, é do que se trata quando lidamos com um modelo por quotas. Aqui assumia as consequências pessoais da não avaliação ou classificaria a todos com nota máxima, porque só assim poderia voltar a deitar a cabeça na almofada à noite com a consciência tranquila.


Note-se: As minhas aulas estarão abertas a observação, não 2, nem 3 vezes por ano, mas sim tantas, quantas vezes nelas eu estiver presente.


Assinado:

O professor que entregou os objectivos individuais chantageado pela impossibilidade de acesso à carreira.

O professor que nos últimos 6 anos lectivos esteve colocado em 11 escolas.

O professor que já rescindiu 2 contratos, 1 com penalização.

O professor que já cancelou um terceiro contrato durante o período experimental porque no dia seguinte à apresentação o substituído também regressou.

O professor que tem uma falta injustificada no seu processo indivídual porque ao meter um artigo 102 este não foi aceite pelo CE, quando ao abrigo da anterior legislação, em vigor no momento da falta, o CE não o poderia ainda recusar, ainda assim foi marcada sem conhecimento do professor.

O professor que tem dezenas de dias de faltas por doença, umas por esse motivo, outras porque para além de professor é um ser humano com vida para além da escola, sim porque há vida para além da escola, alguns é que a não têm.

O professor que se está pouco importando para aquilo que os outros pensam mas que se levanta de manhã tão-somente pelos seus alunos.

O professor que tudo fará para dificultar a todos os níveis a aplicação deste modelo, com prejuízo para quem quer que seja.

O professor que no respeitante ao seu desempenho, continuará a ser o que sempre foi.

O professor que só pede uma coisa: NÃO ME CHATEIEM!!!

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