terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Garcia Pereira arrasa...

A múltipla inconstitucionalidade do sistema criado pelas disposições conjugadas do artigo 46º, nº 3 do ECD e do Decreto-Regulamentar nº 2/2008

Ora, antes de mais, e ainda na perspectiva da apreciação abstracta da constitucionalidade do complexo jurídico-normativo hoje aplicável, afigura-se-nos óbvio - em consonância aliás com o notável voto de vencido do Conselheiro Dr. Mário Tavares lavrado no referido Acórdão nº 184/2008 do Tribunal Constitucional e discordando assim da posição maioritária ali adoptada - que o sistema de quotas instituído pelo Decreto-Lei nº 15/2007 (e em clara contradição com os objectivos, enfaticamente proclamados no respectivo preâmbulo, de combater o autoritarismo burocrático desprovido de conteúdo atribuído aos anterior sistema, e de passar a considerar devidamente toda a actividade do docente, muito especialmente a sua actividade lectiva) se revela, e mais ainda se combinado com o Decreto Regulamentar nº 2/2008, em particular com o seu artigo 21º, nº 5, desproporcionado e de todo desnecessário para atingir tais objectivos mas, mais do que isso, claramente violador quer do basilar princípio da igualdade, constante do artigo 13º da C.R.P., quer dos da proporcionalidade e da Justiça a que toda a Administração Pública se encontra constitucionalmente vinculada por força do artigo 266º da C.R.P..

Por um lado, e sem por ora questionar a bondade dos mesmos, a pluralidade e vastidão dos mecanismos instituídos pelo ECD com vista a assegurar uma avaliação que se pretende exigente e rigorosa põem claramente a nu a desnecessidade, desadequação e desproporção de um sistema “cego” de notas, para usar a feliz expressão do já citado voto de vencido do Conselheiro Dr. Mário Torres.

Mas, sem conceder quanto ao que antecede, sempre se mostraria também patentemente violador do indicado princípio de igualdade, já que possibilitaria que dois docentes em situação exactamente idêntica (mesma classificação média das pontuações atribuídas em cada uma das folhas de avaliação, igual percentagem exigida de cumprimento das respectivas actividades lectivas e, no caso da atribuição de Excelente, idêntico reconhecimento de contributos relevantes para o sucesso escolar dos alunos e para a qualidade das suas aprendizagens, reconhecimento esse feito através da proposta classificativa devida e expressamente fundamentada) seriam afinal classificados de forma diversa em função de um factor a eles completamente estranho e em absoluto arbitrário, como seja o de um exercer funções numa escola ou agrupamento onde, para sua infelicidade, a quota de Excelente ou de Muito Bom já foi atingida e o outro exercer funções em escola ou agrupamento onde, para sua felicidade, a dita quota ainda não foi atingida…

Mas violenta também o igualmente basilar princípio da confiança e segurança jurídica dos cidadãos, ínsito à noção de Estado de direito, consagrada no artº 2º da CRP, porquanto, ainda por cima - e ao invés do que está estabelecido no regime geral de avaliação de desempenho da Administração Pública em geral, onde tais percentagens se encontram prévia e claramente fixadas ou por diploma de natureza legal (Lei nº 66-B/2007, de 28/2) ou, antes disso, de natureza regulamentar (Decreto Regulamentar nº 19-A/2004, de 14/5) - o estabelecimento das quotas de Excelente e Muito Bom dos docentes é afinal remetido para um simples despacho ministerial conjunto, sem determinação da obrigatoriedade da data da sua publicação, podendo assim, até, sê-lo largamente após o início ou mesmo até perto do termo do processo de avaliação, e em função de uma variável não apenas de conteúdo extremamente vago como aleatório e em nada referente ao desempenho individual do avaliado, como é o dos “resultados obtidos na avaliação externa da escola”.

A inaceitabilidade constitucional deste sistema é ainda reforçada pela circunstância de que o princípio da imparcialidade, consagrado no nº 2 do artº 266º da CRP, e também no artº 6º do Código do Procedimento Administrativo, impõe não apenas uma actuação isenta, objectiva, neutral e independente por parte da Administração para com o cidadão e logo também para com os seus funcionários mas igualmente que em todos os procedimentos relativos à admissão, progressão ou avaliação destes, sempre antes da aferição dos avaliados cada um destes deve conhecer, e conhecer com antecedência, todos e cada um dos parâmetros de avaliação, os exactos critérios de classificação e os diversos itens dessa mesma avaliação, e nomeadamente aqueles que definem ou são susceptíveis de definir a sua posição relativa.

(…)

Posted by Paulo Guinote

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