sábado, 12 de abril de 2008

Um acordo ou uma negociata de mútua conveniência?

TOMEI A LIBERDADE DE POSTAR AQUI ESTA ANÁLISE QUE É FEITA NO BLOG DO PROF. RAMIRO:
“ME e Sindicatos: Um acordo ou uma negociata de mútua conveniência?

Perdoe-se-me o cepticismo e este quase involuntário remar contra a maré. O facto é que não consigo descortinar no acordo agora estabelecido entre a plataforma sindical e o Ministério da Educação nem uma vitória dos professores nem um recuo nas reais intenções políticas deste último. Na verdade, o adágio cumpre-se: “É preciso que algo mude para que tudo fique na mesma”. Mais: é preciso que minoritariamente alguém fale e ceda em nome da maioria e, por minoria de razão, vitoriosamente a derrote.
Não gosto da expressão “Traição”. Porém, sem vislumbrar outra melhor alternativa, utilizo-a: os professores foram traídos. De facto Abel, mesmo em democracia, continua a matar Caím.
Os professores (os tais 100.000 que forneceram argumentos mais do que suficientes para que os sindicatos ousassem ser porta-vozes do seu descontentamento e fundamentada indignação), exigiram a suspensão deste modelo de avaliação de desempenho.
Reivindicaram também os professores um modelo de avaliação adequado, moderno e consentâneo com as características das particularidades sociais, económicas e culturais de Portugal e da sua consequente especificidade educativa, recusando quer a visão competitiva e economicista neoliberal quer a irresponsável modelação terceiro-mundista do exercício da sua profissionalidade, uma e outra prenunciadoras do fim da Escola pública.
Ou seja, nunca os professores exigiram não ser avaliados. Propuseram, inclusive, a adopção de modelos de avaliação mais exigentes, compagináveis com aqueles que vigoram (formal ou informalmente) na maioria dos países da União Europeia. Quiseram os professores, em nome da qualidade educativa e na salvaguarda da Escola pública, a suspensão do atabalhoado modelo de avaliação que o ME desde sempre (tecnicamente) mas tardiamente (do ponto de vista político) soube ser inviável e impraticável em Portugal. Porém, amarrado à besta que criou, não quis o ME por si só dar mostras públicas de um penalizador recuo político nesta matéria. Para consumar este recuo político, havia que estrategicamente encontrar outros cúmplices responsáveis. Mas quem? A resposta esta à vista: os sindicatos dos professores aceitaram salvar politicamente as grossas asneiras do governo.
Eis, por isso, os sindicatos a regozijarem-se hoje com o óbvio. Ambos, sindicatos e ME, saiem vencedores. Será que há perdedores? Claro que os há. Perderam não só os professores, mas também os alunos, as famílias e a Escola pública.
Olhe-se para o acordo firmado e pergunte-se descomprometidamente: “A suspensão deste modelo de avaliação está contemplada na negociata?”
Se no grupo dos professores (dos tais 100.000) também se fazem incluir obviamente os contratados, questiono-me: será que algo de significativo mudou em relação à reiterada e confirmada condição de cobaias deste modelo avaliativo durante os próximos tempos?
Não perceberão aqueles crónicos sindicalistas que ao aceitar que os professores sejam avaliados, ainda que com o rebuçado dos designados critérios mínimos, estão implicitamente a sufragar este ou outro ainda mais perverso modelo de avaliação do desempenho?
Não terão ‘aqueles’ sindicalistas profissionais percebido que daqui a cinco (cinco!) meses aquele ou outro modelo avaliativo estará, com o seu aval e conluio, integralmente em vigor?
Não perceberão os sindicalistas que a matéria fundamental de contestação e consequente rejeição dos professores advém de um normativo estruturante, o Estatuto da Carreira Docente, que eles (sindicalistas de carreira) consentidamente se limitaram a “contestar com paninhos quentes”?
Afinal, o que faz correr estes sindicalistas? O que busca esta corporação de velhos dirigentes sindicais?
Será que estes sindicalistas representam os interesses dos professores? Não será que, pelo contrário, cada vez mais eles se auto-representam?
Embora difícil de acreditar, é fácil perceber por que razão os crónicos sindicalistas desta plataforma de interesses corporativos chegaram a acordo com o ME:
Embora possa não parecer, os sindicalistas constituem hoje uma espécie dinossáurica que a troco de algumas enganadoras migalhas aceita a sua própria (auto)extinção. A explicação é fácil:
1º Muitos destes “sindicalistas de topo” desde há décadas que ocupam lugares de direcção nas estruturas sindicais, auto-excluindo-se do quotidiano e da vivência escolares;
2º A esmagadora maioria deles (talvez a totalidade) encontram-se em final de carreira sindical equiparada a carreira docente, motivo pelo qual apenas podem ambicionar obter futuramente uma de três alternativas para eles mais vantajosa:
a) Acreditam e empenham-se para um dia virem a ser secretários ou sub-secretários de Estado de um qualquer governo da nação;
b) Chegados ao topo da carreira fica-lhes bem pedir e exigir mais um escalão na carreira docente ao qual possam ainda ascender e assim aposentarem-se em condições (invejáveis) negadas à quase generalidade dos professores que alegadamente eles representam;
c) Mas - ainda assim não vá o diabo tecê-las - exigem e estabelecem acordo na seguinte «vital matéria»: “Aos dirigentes sindicais é contabilizado, na íntegra, o tempo prestado no exercício de outras funções que não as docentes para efeitos de progressão na carreira”.
Volto a perguntar-me:
1º A criação de um novo escalão no topo da carreira docente era (é) uma prioridade para os 100.000 professores que crítica mas responsavelmente manifestaram o seu descontentamento e priorizaram as razões da sua contestação?
2º Quantos dos 100.000 professores mandataram os sindicatos para que elencasse como sua reivindicação inadiável para esta fase de negociação com o ME, a contagem e o consequente reconhecimento do tempo de serviço prestado em funções de direcção sindical para ascender ao topo do neo-escalão da carreira docente?
3º Porque razão os sindicatos omitiram do seu último comunicado o ponto 10 da matéria anteriormente acordada com o ME, no qual expressamente constava (consta): “Estabelecimento de regras semelhantes àquelas de que neste momento beneficiam os dirigentes da administração pública, para acesso à categoria de professor titular de professores em exercício de outras funções, cargos ou actividades de interesse público, designadamente titulares de cargos políticos, autarcas e dirigentes de associações sindicais.” (Vd. http://www.min-edu.pt/np3/1895.html );
4º…
(Texto a continuar após a próxima ronda negocial dos sindicalistas com o ME. As cenas já vistas dos próximos capítulos confirmarão o desenlace da traição.)

A.A.

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